sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Pesquisa sobre mascaras

Pensei numa mascara pra Alice, isso da um ar de dualidade tambem...

Uma máscara é um acessório utilizado para cobrir o rosto, utilizado para diversos propósitos: lúdicos (como nos bailes de máscaras e no carnaval), religiosos, artísticos ou de natureza prática (máscaras de proteção). A palavra tem, provavelmente, origem no latim mascus ou masca = "fantasma", ou no árabe maskharah = "palhaço", "homem disfarçado". Muitas vezes tribos africanas usam máscaras em cerimônias de passagem entre a vida e a morte.

Principais funções de uma máscara:

disfarce;
símbolo de identificação;
esconder a sua identidade;
transfiguração;
representação de espíritos da natureza, deuses, antepassados, seres sobrenaturais ou rosto de animais;
participação em rituais (muitas vezes presente, porém sem utilização prática);
interação com dança ou movimento;
fundamental nas religiões animalistas;
mero adereço.

Símbolos
Ás vezes a máscara deixa de ser um mero adereço e passa a se tornar um símbolo de caráter enganoso. Vemos isso nas histórias em quadrinhos a máscara não esconde somente a identidade, mas transforma a vida de quem a possui. Os super-hérois colocam as máscaras e se transformam naquilo que não são na frente dos outros.


MÁSCARAS E MASCARADOS
Por António Cravo



Muito tem sido escrito sobre as máscaras e os mascarados de Portugal e do Mundo, quanto à sua origem, significado, morfologia, funcionalidade e outros aspectos, por eminentes etnólogos, quer do Estrangeiro, quer do nosso País.

Se hoje pretendemos evocar este tema tão vasto e difícil é tão somente porque vem a propósito, acerca da exposição de pintura sobre as máscaras e caretos transmontanos que vai estar patente ao público no Museu Abade Baçal de Bragança, e que é da autoria do pintor António dos Santos Silva, natural de Jou, concelho de Murça, e radicado em Paris, há cerca de 30 anos.

A este respeito, contudo, gostaríamos de poder transmitir de uma maneira geral e com algumas particularidades aquilo que nos parece ser mais profundo, acerca dos modelos em que este pintor se baseou, para os seus quadros, agora expostos, que tem a ver, antes de mais, com um mundo no qual temos fortes raízes, embora actualmente! vivamos afastados dele, nesta Civilização Ocidental e nos finais do século XX.

Nesse mundo, o homem criou formas mágicas, míticas, ritualistas e lúdicas durante a noite dos tempos e escondia-se através de disfarces que se chamam máscaras. Depois atravessou o Neolítico formando ciclos agrários ou sazonais, quando já domesticava a planta, o animal e sabia queimar a terra que moldava para o seu vasilhame, e assim continuou através da História.

Para a mais perfeita expressão, esse homem aperfeiçoou os caracteres estéticos da máscara; individualizou a sua fabricação, segundo o uso ao qual era destinada; estudou o seu impacto no grupo social a que pertencia o mascarado; e adaptou as máscaras aos diversos aspectos das forças sobrenaturais e demoníacas que julgava descobrir e conhecer. Deste modo, criou uma variada morfologia entre as diversas culturas que se multiplicaram.

Estes vários aspectos em consideração têm-se prolongado desde as suas origens, pelos "primitivos actuais", até aos animistas presistentes dos nossos dias, em África, Oceania e nas Américas.

Porém,no mundo contemporâneo dos cinco continentes apareceram outras máscaras sem aquele sentido primitivo, baseado nas suas origens longínquas.

Por isso, os etnólogos consideram actualmente as máscaras universais em três grandes grupos, segundo a simbologia,a funcionalidade lúdica e o esvaziamente do seu conteúdo original.

Num primeiro grupo classificam as máscaras de todas as culturas que estejam apenas integradas na própria cultura e sociedade que lhes deram origem e se combinem com o seu objectivo, a sua expressão e a impressão e aceitação sociais.

Neste sentido, cada tipo de máscaras não existe em si mesmo como sendo objecto separado dos seus contextos sociais e culturais. Por isso,neste grupo as máscaras só se consideram autênticas em função das mensagens que nos transmitem, devendo atestar a omnipresença do sobrenatural que pretendem representar e o pululamento dos mitos que nos querem transmitir.

O segundo grupo reúne as máscaras referentes ao espectáculo, por se terem desviado da sua primitiva função, desde a Grécia antiga, passando pela Civilização Romana e atravessando a Idade Média e outras Idades da História até aos nossos dias. As máscaras deste grupo representam apenas uma personagem precisa e a sua estética resulta de normas bem definidas, viradas para o espectáculo ou ambiente lúdico em primeiro lugar.

Um terceiro grupo é chamado grupo das "máscaras falsas", por terem perdido todo o sentido original,mostrando apenas uma aparência da tradição dos povos que tentam representar,mas apenas para serem vendidas aos turistas. São máscaras esvaziadas dum conteúdo contextual quanto à cultura que teimam representar e à sociedade donde são originárias.

Deste três grandes grupos as que têm mais importância no nosso entende,são as máscaras e mascarados do primeiro grupo,a fim de descobrirmos o que resta de simbologia do sobrenatural nos modelos dos quadros da Exposição de António Silva.

O Tesouro das Máscaras
Tansmontanas nos Quadros
de António Silva

A exposicão de António Silva,em Bragança,mostra-nos a realidade actual das máscaras e dos "caretos" do Nordeste Transmontano.

É o segundo pintor que conhecemos a ocupar-se deste tema através da Pintura,depois de João Vieira,natural de Vidago,ter exposto 22 quadros em 1984,na Galeria Quadrum em Lisboa, inspirado também nas máscaras daquela zona do País.

Para compreendermos a complexidade temática dos quadros do segundo pintor, expressa em setenta e cinco telas, suponho que deveremos recorrer a uma ordenação dos suportes reais que lhe preporcionaram os seus modelos; observar os contextos em que nos aparecem aqueles suportes ou máscaras esculpidas;e tentarmos descobrir o que resta do seu "conteúdo funcional originário", de acordo com as informações de Benjamim Pereira, na sua obra "Máscaras Portuguesas"-Lisboa,1973; bem como as informações de outros etnólogos transmontanos.

Os suportes reais ou máscaras,dos seus modelos, reproduzem quase sempre um rosto humano, várias vezes desfigurado com a intencão de as "diabolizar". Por isso, os seus criadores artesãos utilizaram artifícios grotescos, como certos traços anatómicos, figuras assimétricas e expressões fantasistas que muito bem se podem observar nalgumas telas desta Exposição, como por exemplo a do n°31. Noutras podemos ver a decoração da máscara com figuras zoomórficas, como a salamandra e a serpente,como é o caso do quadro n°.1. Noutras o desenho duma caveira, lembrando a Morte, e se puxarmos bem esta ideia até às origens, podemos ainda inculcar o antigo culto dos mortos, embora, actualmente, mostre a íntima redução do Homem até a cinza, como é o caso do quadro nº.9.

Morfologicamente aparece uma maior percentagem de máscaras esculpidas em madeira, seguindo-se, na ordem decrescente, em lata, em couro,em cortiça e mais pobremente em pneumático ou em cartão. Estas esculturas estão também de acordo com os dotes artísticos dos seus autores, especialidades das suas profissões, que António Silva muito bem reproduziu agora nos seus quadros ali presentes.

Nas telas desta sua exposição veja-se que o mesmo pintor revela-nos duas preocupações fundamentais: a primeira foi reproduzir figurativamente a máscara ou o mascarado, o mais próximo possível da realidade dos seus modelos; a segunda preocupação está patente na simbologia que exprime nos cantos dos quadros ou à volta da figura, apenas para nos lembrar alguns vestígios das raízes onde mergulha o seu "conteúdo funcional originário".

É neste sentido que enquadramos as máscaras transmontanas, primeiro grupo das máscaras universais de que temos vindo falar.

Na realidade expressiva dos seus modelos coexistem agora dois contextos: o do politeísmo ou pagão, e o do monoteísmo, embora este tivesse quase esmagado o primeiro.

Só foi graças à linha da tradição popular transmontana que se tem assegurado, até aos nossos dias, a existência de vários elementos do seu primeiro conteúdo e do seu primeiro contexto.

No segundo contexto, simultaneamente litúrgico, lúdico e profano, as máscaras agora ali representadas aparecem-nos, durante as festas invernais, entre o solstício de Inverno e o equinócio de Março, nos dois ciclos principais: o ciclo natalício ou dos Doze Dias, que vai do Natal ao Dia de Reis; e o ciclo carnavalesco, que corresponde às antigas "bacanais de Março da época romana" (Abade Baçal). Actualmente,anda à volta do Entrudo ou Carnaval, durante mais ou menos os quinze dias que o precedem.

Naquelas bacanais,em honra do deus Baco ou Dionísio,invocavam-se as larvas,os maus espíritos e fazia-se a reconciliação com eles, antropomorfizando-os; seguiu-se depois, pelo Carnaval, simbolicamente a celebração do renascer na Natureza. Neste sentido,é um tempo de festas que prepara a chegada da Primavera.

A designação de Carnaval apareceu somente a partir do século X.

Quanto ao ciclo dos Doze Dias, as suas personagens aparecem na Natal, AnoNovo e Dia de Reis, ou somente numa destas festas litúrgicas, ou reaparecem numa ou noutra a seguir,até por volta do dia 20 de Janeiro.

Sobrepõem-se nestes dias, marcados pela liturgia cristã, as Festas dos Rapazes; as Festas do St.Estêvão; as Festas dos Velhos, dos Caretos ou do Chocalheiro, etc.

a) as Festas dos Rapazes ocorrem, ainda hoje,em várias aldeias transmontanas,como Aveleda, Serapicos, Sacoias, Varge, Baçal, Alfaião, etc, do concelho de Bragança;

b) as Festas de St.Estêvão realizam-se também em diversas aldeias do mesmo concelho, como Parada e Grijó de Parada; e ainda na aldeia de Ousilhão, do concelho de Vinhais; na de Torre D.Chama e Vale de Madeiro, no concelho de Mirandela,etc

c) as Festas dos Caretos realizam-se também em Dia de St.Estêvão em Pinela, concelho de Bragança, e em Rebordelo, concelho de Vinhais;

d) as Festas dos Velhos festejam-se na aldeia de Travanca, concelho de Vinhais, em Vale de Porco, concelho de Mogadouro, e em Vila Chã, concelho de Miranda do Douro;

e) e finalmente as Festas do Chocalheiro têm lugar na aldeia de Bemposta, do concelho de Mogadouro. Estas festas aparecem ainda noutras aldeias do mesmo distrito.

André Gago, no ano de 1990,fez uma recolha de informações acerca das máscaras transmontanas representativas destas festas,em localidades dos doze concelhos do Distrito de Bragança,mas o número dos quadros de António Silva ultrapassa este mesmo testemunho.

Em todas estas festas é raro não se observar a omnipresença de ritos litúrgicos cristãos, como que a controlar os desmandos dos portadores das máscaras e mostrar-lhes que o sentido da relação com o sobrenatural é, neste contexto monoteísta, de cima para baixo, isto é, na verticalidade.

Nesta linha de observação, vemos que nalgumas daquelas localidades se celebra um culto religioso, como o de St.Estêvão, normalmente no dia 26 de Dezembro, noutras prolonga-se até dia 27, como em Grijó de Parada, ou até dia 29, como na aldeia de Parada. As Festas dos Rapazes, nas aldeias já mencionadas, realizam-se nos dias 25 e 26 de Dezembro e nalgumas confundem-se com as Festas de St.Estêvão, como por exemplo na aldeia de França, Bragança.

Na manifestação deste culto a St.Estêvão, como por exemplo em Ousilhão, Vinhais, aparece todo um contexto com base na religiosidade cristã, como, por exemplo,a celebração da missa, onde se fazem"ofícios divinos", como a procissão com o andor de S. Estêvão, dirigindo-se para a mesa colectiva ao ar livre, composta de pão e vinho para todos, mas benzida pelo pároco que reza depois com os presentes, antes de se sentar num lugar de honra à cabeceira da mesma,como se vê no quadro nº.15; também se podem observar outros elementos nos quadros nºs.6, 18 e 25 da exposição de António Silva.

Continuando com o exemplo de Ousilhão, observamos uma confusão daqueles elementos religiosos cristãos com os elementos do profano e do lúdico,como a eleição do "Rei"(que, por isso,toma esta festa também o nome de "Reinados") e do "Bispo",numa simbologia do poder temporal e espiritual própria da Idade Média. O "Rei"também pode ser escolhido pelo povo,ou pela obrigação do cumprimento duma promessa, com dois "vassais" para o seu acompanhamento e a escolha dos quatro rapazes ou "moços" para a execução de várias tarefas. Ainda nesta confusão com o profano, no dia 25, à tarde,os quatro "moços",sobressaindo entre outros com trajes especiais e castanholas nas mãos,visitam as casas das aldeias, cantando acompanhados da Caixa e da Gaita-de-Foles, pedindo esmola para a Igreja.

Neste mesmo cortejo entram então os caretos,personagens doutro contexto, que utilizam máscaras de madeira,como por exemplo do quadro nº.10, e pedem também, mas para si, castanhas, chouriços,etc,ou retiram, sem licença, peças dos fumeiros das casas visitadas.

No dia 26, os "moços", como no quadro n°14, abrem outro cortejo semelhante,dão sinais de alvorada, pelas cinco horas da manhã, e vão de novo pelas ruas da aldeia até chegar o meio-dia. No final desta segunda volta e depois de terem comido em casa do "Rei", "Moços" e Mascarados retomam o caminho da Igreja para assistir à Missa.

À entrada da igreja está o padre à sua espera, aspergindo-os com água benta e oferecendo depois um lugar ao "Rei" perto do altar-mor com os dois jovens "vassais". Um dos quatro "Moços" leva um pão para ser benzido no final da missa. Noutros casos, levam 4 ou 5 pães.

Quanto aos mascarados,embora tolerados nos cortejos e mesmo na refeição colectiva, é-lhes "rigorosamente proibida a entrada, no adro da igreja", devendo ficar cá fora quietos e sossegados até sair a procissão.

Isto ainda nos mostra algumas atitudes da acção monoteísta sobre o que resta da expressão cultural pagã, própria do seu contexto originário.

Naquela confusão de contextos, propomo-nos sublinhar o que ainda se pode observar desta cultura pagã ou arcaica, ao longo das várias festas de Inverno/Carnaval do Nordeste Transmontano.

Dão-nos sinais desta cultura pagã a própria máscara, que vem de tempos imemoriáveis e que marca a sua presença em todas aquelas festas sazonais; o porte duma bexiga de porco, por exemplo em Vila Chã de Braciosa, Miranda do Douro, por um mascarado e atada com um cordão que nos sugere um "culto primitivo da fertilidade", como o caso que aparece na imagem do quadro nº.3, algumas manifestações telúricas como o exemplo do casamento de duas montanhas, na época do Carnaval em Azinhoso, Mogadouro; o princípio iniciático, nas Festas dos Rapazes, através das cerimónias dos ritos de passagem da adolescência à juventude; símbolos da "Magna Mater Divina" a Terra Mãe ou a Mãe da fertilidade, como no transmite a "figura tauromórfica" do Chocalheiro de Bemposta, Mogadouro, e se pode observar no quadro n°.2, ou então "a dualidade entre o Bem e o Mal" como o exemplo da Festa dos Velhos de Vale do Porco, Mogadouro, etc, cujas figuras estão bem representadas no quadro n°.1.

Assim, genericamente, os caretos, máscaras, carochos, velhas, chocalheiros ou farandulos são "seres mágicos e proféticos que ao mesmo tempo assumem funções de sacerdote e de diabo, louvando os mortos e criticando os vivos", numa relação do Homem com o sobrenatural, de forma primitiva.

Estes mascarados e máscaras representam ainda vestígios de usos e costumes herdados dos primitivos povos que deambularam por estas paragens da Península Ibérica.

Também as festividades concentradas no Carnaval podem ser consideradas como herança de festas rituais ligadas à agricultura e à fertilidade,sobretudo com a função sagrada de abolir as barreiras entre os homens e a natureza, a fim de melhor circular a força da vida, virando a norma ao contrário,com um carácter de inversão.

Por isso,estes vestígios que acabamos de exemplificar reflectem ainda a simbologia originária das máscaras transmontanas, como prova de terem pertencido longinquamente ao primeiro grupo daquelas máscaras universais, bem próximas das dos presentes povos animistas ou naturalistas dos outros continentes do nosso Globo.

Na homogeneização do mundo rural, com a cultura dos grandes centros actuais que se vai observando nos nossos dias, podemos prever o desaparecimento total das máscaras nos seus contextos festivos, numa consequência também do desaparecimento dos seus artesãos.

Dentro deste processo de vasos comunicantes, do rural e do urbano, podemos ainda prever o desaparecimento dos vestígios vivos que ainda restam do seu conteúdo originário, apagando-se definitivamente na linha tradicional do povo transmontano que lhe tem dado alma até agora.

Por isso, já consideramos memória a exposição de António Silva nesta capital do distrito bragançano, dos dois contextos aindo a traçar, como espólio da cultura transmontana que mereceria preservá-la num lugar certo, como é um Museu. Bragança ficaria muito mais rica se lhe desse também esta atenção, e as nossas máscaras entrariam privilegiadamente, num quarto grupo que designamos por Máscaras da Pintura.

Assim,esta Exposição teria um duplo mérito, bem como as autoridades bragançanas que a promoveram e também consequentemente o seu autor.

De qualquer modo, sentimo-nos desde já reconhecidos a uns e ao autro, pela coragem que demonstraram na realização deste magnífico evento que consideramos um tesouro da Cultura Transmontana.

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