Privatização no Brasil é o processo de venda e compra de empresas públicas ou da parcela sob controle do estado brasileiro em uma empresa de economia mista para investidores e corporações privadas, nacionais ou multinacionais, que ocorreu em diversos governos desde o século XIX até hoje.
A participação do Estado na economia
O processo de privatização no Brasil representou uma mudança radical do papel, até então preponderante, reservado ao Estado na atividade econômica. Desde o primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-1945), quando se implantou uma vigorosa política de substituição das importações, ficou assentado que os grandes empreendimentos, de interesse estratégico para o desenvolvimento do país, deveriam ficar sob tutela estatal. Criaram-se então, a Companhia Siderúrgica Nacional (1940), a Companhia Vale do Rio Doce (1942), e a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (1945). No seu segundo governo (1951-1954), foi fundada a Petrobrás - Petróleo Brasileiro S/A (1953).
Já então a atividade bancária estava há muito tempo fortemente ancorada no Banco do Brasil e na Caixa Econômica Federal, estabelecimentos oficiais de crédito, que atuavam ao lado de outras poucas instituições financeiras, a maioria em mãos do capital estrangeiro, à exceção de pequenas instituições de alcance regional.
Coube ainda a Getúlio idealizar e fundar, em 1952, um banco de fomento, nos moldes do Eximbank dos Estados Unidos: o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico, hoje com a denominação de Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, com capital integralmente subscrito pela União.
Criado com a finalidade de financiar empreendimentos privados, o BNDES permitiu o avanço industrial do Brasil, com a implantação, em especial, da indústria automobilística, já no governo de Juscelino Kubitschek. No entanto, sua atuação foi desvirtuada, pois acabou por se transformar em uma instituição que, a pretexto de socorrer empresas privadas em dificuldade, estatizou diversas delas, a ponto de ser chamado pejorativamente de hospital de empresas falidas.
Foi durante o regime militar (1964-1985) que a estatização da economia experimentou seu maior incremento, com a criação pelos governos federal e estaduais de um grande número de empresas estatais, que, por sua vez, criavam subsidiárias. Isso tornava difícil até quantificar seu número exato, sendo certo que se aproximavam de 500. Tais empresas atuavam em setores estratégicos, mas também em áreas de menor importância como hotelaria e supermercados. Chegou-se ao extremo de se criar uma empresa estatal para realizar apenas uma obra: a construção da Ponte Rio-Niterói. O grande objetivo que circundava as criações de estatais pelos militares era o de aumentar o nacionalismo no país.
Coincidência ou não, foi também durante o regime militar que o Brasil experimentou seus mais altos níveis de crescimento econômico, - que chegaram a atingir mais de 13% em um único ano, quando Delfim Netto ocupava o cargo de Ministro da Fazenda.
[editar] Medidas uniformizadoras
As empresas estatais eram submetidas à supervisão de diversos ministérios, cada qual impondo suas próprias regras de administração. Critérios técnicos não raro eram preteridos por razões de conveniência política. Por exemplo, aumentos de capital eram decididos sem a prévia definição de recursos orçamentários para esse fim, revelando nenhuma preocupação com relação a seus reflexos sobre o gasto público em geral.
Para impor alguma uniformidade à gestão empresarial, decidiu-se concentrar seu controle na área econômica do Governo, por meio de órgãos subordinados à então Secretaria de Planejamento da Presidência da República e ao Ministério da Fazenda.
Assim, foi criada a Secretaria de Controle de Empresas Estatais – SEST (1979), voltada para a eficiência da gestão, e, em 1980, atribuiu-se à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a competência para representar a União na assembléia geral das empresas estatais. Em 1986, já no Governo de José Sarney, foi criada a Secretaria do Tesouro Nacional, com a atribuição, entre outras, de administrar os ativos da União junto às empresas estatais. Mas como a supervisão ministerial foi mantida, essas medidas tiveram eficácia relativa.
Cabia à SEST recomendar a privatização de empresas, mas nada de significativo foi feito na década de 1980, salvo a devolução à iniciativa privada de empresas em dificuldades econômicas absorvidas pelo Estado.
[editar] Privatizações no Governo Collor
Fernando Collor de Mello (1990-1992) foi o primeiro presidente brasileiro a adotar as privatizações como parte de seu programa econômico, ao instituir o PND – Programa Nacional de Desestatização pela Lei nº 8.031, de 1990. No entanto, das 68 empresas incluídas no programa, apenas 18 foram efetivamente privatizadas, pois Collor teve sua ação obstaculizada com os problemas surgidos na privatização da Viação Aérea São Paulo – VASP. O Plano Collor, elaborado pela ministra Zélia Cardoso de Mello, implementou um modelo neoliberal de abertura às importações, privatização, modernização industrial e tecnológica [1]. A política econômica implementada pela ministra desencadeou um dos maiores programas de privatização do mundo e gerou grande economia para as contas públicas e diminuição da dívida do Estado [1]: "detectamos um aumento na lucratividade e na eficiência operacional destas empresas. A perda do suporte financeiro do estado também implica um ajuste financeiro por meio do aumento da liquidez corrente e redução do endividamento de longo prazo".
da empresa holding Siderurgia Brasileira S.A. – SIDERBRAS, após absorver os passivos das empresas subsidiárias. A primeira estatal privatizada, no dia 24 de outubro de 1991, foi a USIMINAS, siderúrgica mineira localizada no município de Ipatinga, fato que gerou grande polêmica na época pois, das empresas estatais, ela era uma das mais lucrativas.
O grande beneficiário no processo de privatização de siderúrgicas foi o Grupo Gerdau, que adquiriu a maior parte das empresas siderúrgicas. A Companhia Siderúrgica Nacional, marco pioneiro da presença do Estado na economia, foi adquirida pelo grupo liderado pelo empresário Benjamin Steinbruch, que mais tarde adquiriria a Companhia Vale do Rio Doce. Herdada da administração Collor de Mello, e continuada nos governos Fernando Henrique e Lula da Silva [2], a privatização ocorreu em vários setores da economia: Vale, a maior empresa no mercado de minério de ferro e pelotas do mundo (posição que atingiu em 1974, e desde então sempre manteve), se tornou uma das maiores multinacionais do mundo e - em grande parte graças ao aumento no preço internacional do minério de ferro, que mais que dobrou entre 2005 e 2006 - multiplicou seu lucro em mais de vinte vezes; seu valor de mercado passou de 8 bilhões em 1997 para 160 bilhões de reais em 2007. Estes números só fazem sentido de forma comparativa: no mesmo período o valor das ações da empresa de economia mista Petrobras, não privatizada, subiu 1.200% entre maio de 1997 e junho de 2007 (50% a mais que as ações da Vale, privatizada) e seu valor de mercado superou a marca dos cem bilhões de dólares [3]. Fonte: Petrobras - Relações com o investidor: Cotações online, Histórico das ações/Brent (consulte o período desejado) [4]. A empresa de economia mista Petrobras obteve um lucro recorde em 2006 de 25,9 bilhões de reais [5], tornou-se a oitava maior empresa de petróleo do mundo,[6] e antigiu a oitava posição dentre as companhias mais respeitadas do mundo [7]. Destacam-se também Embraer e Telebrás. A Embraer, de acordo com um estudo da consultoria Economática, tinha em 1995, logo após sua privatização, um valor de mercado de R$ 1,7 bilhão e superou, em março de 2007, os R$ 16 bilhões [8], o que representa um crescimento de quase 10 vezes. Comparativamente, no mesmo período, o valor médio de mercado das empresas brasileiras cotadas em Bolsa (representadas pelo índice Bovespa) cresceu cerca de 13 vezes, tendo o índice passado de 4.000 em dezembro de 1994 para cerca 52.000 em abril de 2007.[9][10].
Com o impedimento de Collor e a posse de Itamar Franco (1992-1995), nitidamente contrário às privatizações, o processo não foi adiante, não obstante a presença de Fernando Henrique Cardoso no Ministério da Fazenda. Em seu governo, apenas concluiu-se a privatização de empresas do setor siderúrgico, iniciada por Collor.
[editar] Privatizações no Governo FHC
Com a criação do Conselho Nacional de Desestatização, pela Lei nº 9.491, Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), adotando algumas recomendações, então em vigor, do Consenso de Washington e do FMI deixou claro seu propósito de implementar um amplo programa de privatizações. Ao mesmo tempo, fez bem sucedidas gestões na área política e financeira para enquadrar os Estados no programa, condicionando as transferências de recursos financeiros da União para os Estados à submissão dos governadores às políticas recomendadas pelo FMI.
Enquanto a quase totalidade dos economistas neoliberais e os defensores do fundamentalismo de livre mercado apoiava a concepção do projeto de desestatização, vários economistas de outras escolas de pensamento econômico, vários partidos de oposição, sindicatos trabalhistas e suas respectivas centrais sindicais, bem como muitos juristas e outros setores representativos da sociedade civil manifestaram-se contrários ao processo de privatização tal como fora anunciado; tentaram, sem sucesso, inviabilizá-lo por meio de manifestações e medidas judiciais. Os leilões de privatização, que foram públicos, se realizaram na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro e foram objeto de violentos protestos de militantes esquerdistas.
Um evento que parece corroborar a tese de falta de lisura desses leilões seria o da privatização da Eletropaulo. No caso, a licitante - a AES americana - que estava em situação pré-falimentar [11] no seu país de origem, obteve a liberação de um financiamento do BNDES no valor de 100% da aquisição. Como a empresa privada americana AES, que adquiriu o controle da Eletropaulo, não pagou nem a primeira parcela do financiamento, o BNDES, uma empresa pública brasileira, viu-se obrigada, pela legislação bancária vigente, a lançar em "provisão para devedores duvidosos" (prejuízo), no primeiro trimestre de 2003, a importância correspondente a 100% do valor que havia emprestado à AES. Isso gerou um prejuízo recorde de R$ 2,4 bilhões ao BNDES naquele trimestre. Desta forma sofisticada e de difícil compreensão para a maioria da população brasileira, especuladores internacionais, sem desembolsar um único dólar, operaram a "transferência dos recursos públicos para a propriedade privada de grupos privilegiados sob um aparente manto de legalidade" como bem descreveu Stiglitz. Com isso, o Poder Público não recebeu efetivamente nada pela venda da Eletropaulo: já que o BNDES fornecera todo o aporte necessário para a aquisição da antiga estatal. [12]
Numa segunda etapa, para tentar minorar o enorme prejuízo sofrido pelo banco público, que chegou a ter sua solidez financeira abalada por essa operação de "privatização" da Eletropaulo, seu presidente Carlos Lessa conseguiu obter, após 11 meses de duras negociações, um acordo no qual o BNDES recebeu como dação em pagamento pela dívida da AES "50% menos uma das ações da Eletropaulo" e mais "debentures conversíveis em ações emitidas pela AES, pagáveis em nove anos".[13] Ou seja, o BNDES forneceu a totalidade do dinheiro para a "privatização" e acabou ficando só com metade menos uma das ações da antiga empresa pública. [12] Uma ação criminal foi proposta pelo Ministério Público contra os então administradores do BNDES responsáveis pela operação, tendo sido a denúncia aceita pelo Poder Judiciário[14]
Críticas partiram também de vários economistas e do meio acadêmico que, embora estivessem de acordo com a filosofia do programa, viam nele duas grandes falhas. A primeira era a possibilidade de os eventuais compradores poderem efetuar parte do pagamento com as chamadas "moedas podres", títulos da dívida pública emitidos pelos sucessivos governos com o objetivo de resolver crises financeiras e que, ao se tornarem inegociáveis, pressionavam o déficit público. Criticava-se não só a possibilidade de esses títulos serem aceitos, mas que o fossem pelo seu valor de face, quando seu valor de mercado era nulo ou quase nulo; isso deu um "windfall gain" considerável a seus detentores..
A segunda falha, na visão dos críticos, era permitir, tal como no caso da Eletropaulo acima citado, que o BNDES financiasse parte do preço de compra (no caso da Eletropaulo o aporte foi de 100% e a compradora, a AES, não teria pago em dia nem a primeira prestação).[15] Ou seja, recursos públicos em tais casos seriam indevidamente utilizados na compra do patrimônio público por empresas privadas, o que se configuraria em uma indevida "apropriação"[16] do patrimônio da nação por grupos privados privilegiados. O acesso ao crédito seria assegurado inclusive aos compradores estrangeiros, teoricamente em desacordo com a tradição seguida, até então, pelo banco nacional de fomento.
O resultado final das privatizações revelou um aspecto peculiar do programa brasileiro: algumas aquisições somente foram feitas porque contaram com a participação financeira dos fundos de pensão das próprias empresas estatais (como no caso da Vale) ou da participação de empresas estatais de países europeus; o controle acionário da Light Rio, por exemplo foi adquirido pela empresa estatal de energia elétrica da França.
Ao longo dos oito anos de mandato de Fernando Henrique Cardoso, as privatizações lograram atingir a receita total de 78,61 bilhões de dólares, sendo 95% em moeda corrente (nessa percentagem estão incluídos os financiamentos concedidos pelo BNDES), e com grande participação dos investidores estrangeiros, que contribuíram com 53% do total arrecadado. Deste total, 22,23 bilhões de dólares referem-se à privatização do setor elétrico e, 29,81 bilhões de dólares à do setor de telecomunicações.
[editar] Privatizações no Governo Lula
O governo Lula foi responsável pela privatização de cerca de 2,6 mil quilômetros de rodovias federais, que foram a leilão em 9 de outubro de 2007[17]. O grande vencedor do leilão para explorar por 25 anos pedágios nas rodovias foi o grupo espanhol OHL.
As estradas privatizadas são, seguido do vencedor do leilão no determinado lote:
* BR-381 Belo Horizonte (MG) – São Paulo (SP) - grupo OHL
* BR-393 Divisa (MG-RJ) – Via Dutra (RJ) - Acciona
* BR-101 Ponte Rio–Niterói (RJ) – (ES) - grupo OHL
* BR-153 Divisa (MG-SP) – Divisa (SP-PR) - BR VIAS
* BR-116 São Paulo (SP) – Curitiba (PR) - grupo OHL
* BR-116 Curitiba (PR) – Divisa (SC-RS) - grupo OHL
* BR-116/376/PR-101/SC Curitiba (PR) – Florianópolis (SC) - grupo OHL
Na recente concessão de rodovias federais, em que foi adotado o procedimento de decisão social na elaboração do edital licitatório, as empresas que se saíram vitoriosas na licitação ofereceram-se para administrar as estradas por um pedágio médio de R$ 0,02 por quilometro, o que representa um custo médio seis vezes inferior ao custo médio cobrado no pedágio das rodovias Anhangüera/Imigrantes, que foram privatizadas na década anterior, quando ainda prevaleciam outros critérios. O emprego desses novos critérios licitatórios, que adotaram a moderna teoria do desenho de mecanismos [18][19], resultaram numa Eficiência de Pareto muito superior à obtida apenas pelo critérios anteriores. A economia obtida pela adoção dessa moderna tecnologia se refletirá em ganhos de competitividade para toda a economia brasileira.[20]
Houve também a privatização de 720 quilômetros da Ferrovia Norte-Sul para a Vale do Rio Doce pelo valor de R$1,4 Bilhão.
Entre outras privatizações do governo Lula, estão[21]:
* Banco do Estado do Ceará
* Banco do Estado do Maranhão[22]
* Hidrelétrica Santo Antônio
* Hidrelétrica Jirau
* Linha de transmissão Porto Velho (RO) – Araraquara (SP)
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